Baixo Vouga Lagunar: diques são solução

segunda, 04 de junho 2012

Dar continuidade ao projeto de proteção do Baixo Vouga Lagunar (BVL) e concluir o dique é uma das soluções apontadas por um estudo elaborado no âmbito do programa Erasmus e apresentado no workshop “Dois Temas: Gestão da Água e Intervenção Territorial Integrada”, realizado na última semana em Estarreja no âmbito do projeto F:ACTS.

Para o presidente do Município, “a participação da Câmara Municipal de Estarreja neste programa F:ACTS aprofunda a nossa preocupação de sustentabilidade e  promove o maior conhecimento de uma área cheia de potencialidades”. Por outro lado, refere José Eduardo de Matos, paralelamente “à nossa reivindicação política regional para o avanço do projeto do Baixo Vouga, estas ações chamam a atenção e antecipam riscos que requerem inadiáveis intervenções há muito necessárias”.

O exercício realizado no âmbito do programa Erasmus por um grupo de 44 estudantes, de 13 nacionalidades e 4 universidades, explorou cenários e alternativas de intervenção no BVL, na procura de soluções para os problemas da diminuição de produtividade de atividades tradicionais, degradação da base ecológica de recursos e ausência de alternativas ou oportunidades socioeconómicas.

A opção “Proteção” contra o avanço da água salgada naquele espaço é uma das soluções defendidas pelo grupo que ainda no âmbito de medidas infraestruturais aponta a criação de pequenas barragens de controlo de água doce e proteção das áreas agrícolas e a eliminação de espécies exóticas tendo em vista a defesa da paisagem do Bocage.
 
O estudo apresentado por Filomena Martins, do Departamento de Ambiente e Ordenamento da Universidade de Aveiro, analisou também a opção “Adaptação”, que admite a salinização de terrenos a norte e a introdução de culturas mais resistentes à presença do sal, mantando-se a agricultura tradicional nas zonas não salinizadas e o incremento de atividades ligadas à observação da natureza.


Polis da Ria de Aveiro estuda prolongamento do Dique Sul

A solução estudada pela Polis Litoral Ria de Aveiro foi apresentada por Luís Bandeira, Sociedade POLIS da Ria de Aveiro, e assenta na reutilização de dragados nos canais da Ria. Ou seja, a execução do prolongamento do dique sul até ao Rio Vouga pode recorrer ao depósito de materiais dragados, numa solução económica e ambientalmente vantajosa. As conclusões dos estudos promovidos pela Polis serão apresentadas em junho. Foram inspecionadas 43 estruturas de proteção e definidas zonas prioritárias, nas quais se enumera o dique do BVL.  


Amplitude de marés é hoje o dobro de há 100 anos

O anteprojeto do sistema de defesa e controle dos efeitos das marés, que desde os anos 90 defende a construção do dique, esteve novamente em análise desta vez por este grupo de trabalho do F:ACTS que envolve 8 países europeus. Pedro Brito, da Direção Geral de Agricultura e Desenvolvimento Rural (DGADR), relembrou os pontos fortes do tão falado projeto do Baixo Vouga, sublinhando a fragilidade dos sistemas primários de diques de proteção face aos novos efeitos crescentes das marés. Em 1905 a amplitude das marés vivas era de 1,45m, em 1990 subiu para 2,50m. E em 2006, a amplitude sobe para mais do dobro, 3,73m.

O reforço do dique existente a sul e a norte é a principal intervenção defendida por este anteprojeto, para defender o solo da água salgada, complementando com a criação de estruturas hidráulicas no Rio Velho, em Canelas, Salreu e no Rio Antuã. O projeto prevê ainda a defesa e controle de cheias, uma vez que a zona é ainda um local de descarga do Vouga, Antuã e de diversas linhas de água, através do reforço de diques, reabilitação de valas, implantação de descarregadores de cheias, reforço da vazão do esteiro da Linha e do Rio Jardim e o desassoreamento do leito do Antuã.

“Importa corrigir esta situação intervindo nos sistemas de defesa das marés e cheias, seguindo critérios ajustados aos níveis preconizados para uso dos solos”, afirmou Pedro Brito lembrando que o Estudo de Impacte Ambiental foi aprovado em 2001 e a Declaração de Impacte Ambiental favorável e datada de 2002 é válida até 2013.


Zona continua em risco

Estas soluções não são novidade para Casimiro Calafate, presidente da Junta de freguesia de Cacia, que foi durante 10 anos presidente Associação de Beneficiários do Baixo Vouga. Agricultor em tempo parcial, hoje com 66 anos, lembra que aos 6 anos “já andava com o meu avô junto à ria, porque se produzia lá arroz, e tapávamos a água salgada com uma enxada e com a lama”. Um cenário que se alterou profundamente e por culpa da ação direta do homem. “O estado é o responsável”, afirma lembrando as consequências negativas das obras na Barra do Porto de Aveiro.

Para este acérrimo defensor do projeto de defesa do BVL é “chocante que venham os jovens dizer que somos criminosos com o nosso território e o deixamos abandonado”, afirma referindo-se ao estudo do Erasmus. Casimiro Calafate reafirma que “é um crime o que se está a fazer ao Baixo Vouga mas sobretudo ao território nacional, que é dos melhores que temos em termos agrícolas e ambientais e ninguém tem tido a sensibilidade para o defender como deve ser”.

Mostra-se crítico na medida em que “duas entidades diferentes apresentaram as mesmas soluções. Continuamos a gastar dinheiro sem ter obra e sem resolvermos o problema do Baixo Vouga e isso é lamentável”.
 

Agricultor apela a intervenção no terreno

Referenciado pelo presidente da Câmara Municipal na abertura da sessão, Casimiro Calafate agradeceu a abordagem. “Ele sabe que há muitos anos que ando à volta disto. Somos uns grandes defensores do Baixo Vouga”. O agricultor apela ao bom senso dos governantes deste país para que “olhem para este Baixo Vouga e outros que existem neste pais e que os defendam. Precisamos de ter alguma independência na parte alimentar”.


Discussão é necessária, defende DGADR

Filipa Horta Osório, subdiretora da DGADR, considera que “não estão exploradas todas as soluções para a região” salientando a importância dos momentos de reflexão. “É necessária muita discussão e um maior envolvimento de todos os intervenientes no terreno, que é exatamente o objetivo deste workshop”, referiu. O não avanço do anteprojeto no terreno não se deve por isso a questões financeiras, assegura a responsável. “A construção de todos os diques pode não ser a melhor solução para a biodiversidade e a manutenção de um sistema de agricultura conciliador com o ambiente e natureza”.

O Baixo Vouga Lagunar constitui uma das áreas em estudo no âmbito do programa INTERREG IV-C, designado por F:acts! - Forms for: Adapting to Climate change through Territorial Strategies!”, por ser uma zona ameaçada quer pela intrusão de água salina, quer pelas cheias que têm vindo a afetar os terrenos agrícolas. Foram escolhidas cinco áreas sensíveis, localizadas em países europeus, para constituírem os projetos-piloto desta ação.